Mapeamento no Preventório: mudanças entre as edições

2 441 bytes adicionados ,  19 de julho de 2022
m
Linha 8: Linha 8:
Fornazin nos convidou para escrevermos um verbete sobre o mapeamento colaborativo que estamos fazendo no Morro do Preventório. Pera aí, mapeamento colaborativo? Num primeiro momento a gente estranhou esse adjetivo para caracterizar o que fazemos no Preventório. Preferimos o termo mapeamento comunitário justamente para nos diferenciar dos coletivos não-favelados (por exemplo, os [https://www.youthmappers.org/ youthmappers]) em sua maioria estrangeiros que se reconhecem como praticantes de um conceito chamado de [https://pt.wikipedia.org/wiki/Ci%C3%AAncia_cidad%C3%A3 Ciência Cidadã]. Apesar dos “fazedores” de mapas cidadãos produzirem mapas abertos de forma colaborativa e voluntária, algo de grande valor, eles são adeptos de uma visão de mundo mais alinhado com a crença que as ciências e tecnologias são neutras e positivas, enquanto nós acreditamos que os efeitos positivos, negativos ou nulos das ciências e das tecnologias dependem de onde, de quando e por quem elas são desenvolvidas. Amplie a figura '''Não existem casas e edifícios nos Morros da Babilônia e do Chapéu Mangueira?''' e leia sua legenda com atenção.
Fornazin nos convidou para escrevermos um verbete sobre o mapeamento colaborativo que estamos fazendo no Morro do Preventório. Pera aí, mapeamento colaborativo? Num primeiro momento a gente estranhou esse adjetivo para caracterizar o que fazemos no Preventório. Preferimos o termo mapeamento comunitário justamente para nos diferenciar dos coletivos não-favelados (por exemplo, os [https://www.youthmappers.org/ youthmappers]) em sua maioria estrangeiros que se reconhecem como praticantes de um conceito chamado de [https://pt.wikipedia.org/wiki/Ci%C3%AAncia_cidad%C3%A3 Ciência Cidadã]. Apesar dos “fazedores” de mapas cidadãos produzirem mapas abertos de forma colaborativa e voluntária, algo de grande valor, eles são adeptos de uma visão de mundo mais alinhado com a crença que as ciências e tecnologias são neutras e positivas, enquanto nós acreditamos que os efeitos positivos, negativos ou nulos das ciências e das tecnologias dependem de onde, de quando e por quem elas são desenvolvidas. Amplie a figura '''Não existem casas e edifícios nos Morros da Babilônia e do Chapéu Mangueira?''' e leia sua legenda com atenção.


Isso não quer dizer que haja alguma contradição insuperável entre as formas de co-laborar dos métodos de mapeamento comunitário e colaborativo. Muito pelo contrário, o trabalhar em conjunto do método comunitário (a “colaboração” comunitária) que inventamos no Preventório utiliza muitas ferramentas produzidas pelos cientistas cidadãos. Contudo, nós conseguimos transgredir algumas assimetrias e opressões embutidas nessas ferramentas em favor de uma produção de conhecimentos que faça sentido para o território, que tenha a cara, o jeito e a voz de quem vive o território.
Isso não quer dizer que haja alguma contradição insuperável entre as formas de co-laborar dos métodos de mapeamento comunitário e colaborativo. Muito pelo contrário, o trabalhar em conjunto do método comunitário (a “colaboração” comunitária) que inventamos no Preventório utiliza muitas ferramentas produzidas pelos cientistas cidadãos. Contudo, nós conseguimos transgredir algumas assimetrias e opressões embutidas nessas ferramentas em favor de uma produção de conhecimentos que faça sentido para o território, que tenha a cara, o jeito e a voz de quem vive o território. As imagens '''Mutirão Cidadão de Mapas Virtual Virtuoso''' e '''Preventório antes e depois da atuação dos mapeadores comunitários''' são evidências desse exercício prazeroso de transgredir.
 
Nós não descartamos a colaboração cidadã (que segue o viés da ciência cidadã e do conceito de cidadania) dos mapeadores da comunidade OpenStreetMaps. Nós simplesmente cruzamos esse tipo de colaboração com as ações comunitárias e solidárias do Preventório. Exemplo desse cruzamento entre o comunitário e o cidadão foi o '''Mutirão Cidadão de Mapas Virtual Virtuoso''' que realizamos juntando mapeadores da comunidade OpenStreetMaps e pessoas que vivem o território. A rigor, as práticas de mapeamento colaborativo da comunidade OpenStreetMaps costumam convocar pessoas para produzirem mapas através de mapathons (maratonas de mapas), uma prática derivada das hackathons (maratonas hackers para desenvolvimento de software) onde via de regra ocorre uma competição entre equipes na qual os melhores hackers são reconhecidos por seus feitos tecnológicos. Mesmo sendo as contribuições realizadas aos mapas OpenStreetMaps majoritariamente voluntárias, maratonas antes de mais nada são competições. Dado esse contexto, como você convoca pessoas numa favela para ajudar alguém através de uma competição? É possível? É possível. É estranho? Parece que sim. Por exemplo, quando alguém está precisando de ajuda para levantar uma laje na favela, a gente faz uma feijoada ou a gente faz uma maratona? Quando alguém está precisando de um remédio, a gente pede uma doação, faz uma rifa ou faz uma competição?
 
 
Pensando nessas questões, a gente converteu a proposta da mapathon em um convite às comunidades tanto de mapeadores quanto de moradores para um Mutirão de Mapas (talvez esse tenha sido o primeiro mutirão de mapas do OpenStreetMaps). Fizemos um convite. Um convite transgressor que cruzou conceitos e contextos diferentes: o mutirão, a cidadania, o virtual e o presencial. Será que a colaboração independemente de ser comunitária ou cidadã começa com um convite? Será que os convites transgressores são mais potentes? Será que eles produzem conhecimentos mais potentes e mais diversos?  Amplie a imagem Preventório antes e depois da atuação dos mapeadores comunitários. e veja como um vazio “cidadão” virtual se converteu em pontos luminosos de cidadania comunitária.
== As Quatro Dimensões ==
== As Quatro Dimensões ==
Após quase dois anos de projeto, formalizamos uma metodologia de trabalho a partir de uma oficina. Ela foi ministrada a pedido do Projeto Tamo Junto, do Dicionário de Favelas Marielle Franco, em 2021. A metodologia conta com quatro dimensões a serem levadas em consideração no ato de mapear: Legitimidade; Planejamento Comunitário; Mapeamento e Ações Locais; e Tecnologias. Elas estão interligadas, de modo que, ao tratarmos de uma dimensão, é impossível não tratarmos das outras ao mesmo tempo.
Após quase dois anos de projeto, formalizamos uma metodologia de trabalho a partir de uma oficina. Ela foi ministrada a pedido do Projeto Tamo Junto, do Dicionário de Favelas Marielle Franco, em 2021. A metodologia conta com quatro dimensões a serem levadas em consideração no ato de mapear: Legitimidade; Planejamento Comunitário; Mapeamento e Ações Locais; e Tecnologias. Elas estão interligadas, de modo que, ao tratarmos de uma dimensão, é impossível não tratarmos das outras ao mesmo tempo.
32

edições