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Dossiê publicado originalmente na '''Revista USP''', n. 129 de 2021. Para acessar o Dossiê na íntegra, [https://www.revistas.usp.br/revusp/issue/view/12074 clique aqui]. | Dossiê publicado originalmente na '''Revista USP''', n. 129 de 2021. Para acessar o Dossiê na íntegra, [https://www.revistas.usp.br/revusp/issue/view/12074 clique aqui]. | ||
Autoria: Bruno Paes Manso (Núcleo de Estudos da Violência/USP) e Luis Felipe Zilli (Núcleo de Estudos em Segurança Pública (FJP). | |||
== | == Sobre''' '''== | ||
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'''Quanto mais homicídios, mais frágil a democracia''' | '''Quanto mais homicídios, mais frágil a democracia''' | ||
A violência letal, intencional e armada tem sido um dos grandes desafios políticos para as instituições democráticas no contexto atual do Brasil urbano. Mais do que meramente um problema de segurança pública, a concentração de homicídios em alguns territórios metropolitanos ajuda a localizar, no mapa brasileiro, a ação de grupos armados e o domínio que exercem sobre bairros ou conjuntos de favelas, submetendo a população local aos seus próprios interesses. Seja pela constante ameaça ou mesmo pelo uso concreto da violência, tais grupos controlam diversos tipos de negócios legais e ilegais nesses territórios, garantindo lucros elevados para a sustentação e expansão de suas atividades, corroendo a institucionalidade democrática em nível local e apelando para a flexibilização do monopólio legítimo da força pelo Estado. | A violência letal, intencional e armada tem sido um dos grandes desafios políticos para as instituições democráticas no contexto atual do Brasil urbano. Mais do que meramente um problema de [[Segurança Pública e Direitos Humanos: 100 dias de governo Witzel na Baixada Fluminense|segurança pública]], a concentração de homicídios em alguns territórios metropolitanos ajuda a localizar, no mapa brasileiro, a ação de grupos armados e o domínio que exercem sobre bairros ou conjuntos de favelas, submetendo a população local aos seus próprios interesses. Seja pela constante ameaça ou mesmo pelo uso concreto da violência, tais grupos controlam diversos tipos de negócios legais e ilegais nesses territórios, garantindo lucros elevados para a sustentação e expansão de suas atividades, corroendo a institucionalidade democrática em nível local e apelando para a flexibilização do monopólio legítimo da força pelo Estado. | ||
Essas disputas violentas pelo poder nos territórios possuem características em comum nos diversos estados do Brasil, assim como especificidades locais. Os próprios grupos podem ser mais ou menos estruturados, com ou sem comandos ou hierarquias; podem se financiar pela venda de drogas e outros tipos de atividades criminosas, bem como ter maior ou menor interface com negócios legais; podem ter participação de policiais ou funcionar como grupos paramilitares, bem como ter maior ou menor ligação com dinâmicas próprias do sistema penitenciário. | Essas disputas violentas pelo poder nos territórios possuem características em comum nos diversos estados do Brasil, assim como especificidades locais. Os próprios grupos podem ser mais ou menos estruturados, com ou sem comandos ou hierarquias; podem se financiar pela venda de drogas e outros tipos de atividades criminosas, bem como ter maior ou menor interface com negócios legais; podem ter participação de policiais ou funcionar como grupos paramilitares, bem como ter maior ou menor ligação com dinâmicas próprias do sistema penitenciário. | ||
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Nas cidades onde esses grupos são menos estruturados, a situação pode ser ainda mais dramática: as rivalidades e conflitos difusos passam a definir o cotidiano de determinados bairros. A disposição para matar e se tornar autoridade soberana no território provoca reações violentas, incentivando o surgimento de grupos rivais prontos a se antecipar e a matar antes de morrer, travando disputas que muitas vezes duram anos a fio. Essa tensão incentiva jovens a se armar e a se aliar a colegas para se defenderem, alimentando ciclos incessantes de vinganças que multiplicam as pessoas e grupos dispostos a ingressar nos conflitos. | Nas cidades onde esses grupos são menos estruturados, a situação pode ser ainda mais dramática: as rivalidades e conflitos difusos passam a definir o cotidiano de determinados bairros. A disposição para matar e se tornar autoridade soberana no território provoca reações violentas, incentivando o surgimento de grupos rivais prontos a se antecipar e a matar antes de morrer, travando disputas que muitas vezes duram anos a fio. Essa tensão incentiva jovens a se armar e a se aliar a colegas para se defenderem, alimentando ciclos incessantes de vinganças que multiplicam as pessoas e grupos dispostos a ingressar nos conflitos. | ||
Em diversas ocasiões, as forças policiais, que deveriam agir estrategicamente para identificar e impedir a ação dos candidatos a tiranos dos territórios, acabam atuando como mais um grupo a usar da violência na disputa pelo poder local. Adotando mentalidade de gangues, agentes públicos jogam gasolina na fogueira ao emularem a lógica da guerra contra o crime, contribuindo ainda mais para fragilizar a legitimidade das instituições que deveriam representar. Em vez do fortalecimento do Estado de direito nesses territórios, crescem os homicídios interpessoais no Brasil e aumentam as mortes promovidas por policiais durante o trabalho. | Em diversas ocasiões, as forças policiais, que deveriam agir estrategicamente para identificar e impedir a ação dos candidatos a tiranos dos territórios, acabam atuando como mais um grupo a usar da [[Violência, Criminalidade, Segurança Pública e Justiça Criminal no Brasil: Uma Bibliografia (resenha)|violência]] na disputa pelo poder local. Adotando mentalidade de gangues, agentes públicos jogam gasolina na fogueira ao emularem a lógica da guerra contra o crime, contribuindo ainda mais para fragilizar a legitimidade das instituições que deveriam representar. Em vez do fortalecimento do Estado de direito nesses territórios, crescem os homicídios interpessoais no Brasil e aumentam as mortes promovidas por policiais durante o trabalho. | ||
Nesse contexto, o elevado número de homicídios em determinados territórios das cidades brasileiras acaba funcionando como um termômetro para identificar o grau de fragilidade das instituições democráticas em nível local, sobretudo em sua pretensão de garantir direitos aos moradores. Nos locais onde o Estado é incapaz de preservar a vida e outros direitos civis, homens armados se fortalecem como autoridades, tendo a prerrogativa do uso da violência – até mesmo letal – para beneficiar seus interesses e negócios de grupo. | Nesse contexto, o elevado número de homicídios em determinados territórios das cidades brasileiras acaba funcionando como um termômetro para identificar o grau de fragilidade das instituições democráticas em nível local, sobretudo em sua pretensão de garantir direitos aos moradores. Nos locais onde o Estado é incapaz de preservar a vida e outros direitos civis, homens armados se fortalecem como autoridades, tendo a prerrogativa do uso da violência – até mesmo letal – para beneficiar seus interesses e negócios de grupo. | ||
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Para fechar, Giovanni França (UFMS) analisa o envolvimento de jovens com a criminalidade no estado de Mato Grosso do Sul (MS), demonstrando como a expansão do narcotráfico em todas as regiões do estado e os conflitos entre as duas principais facções criminosas do Brasil pela disputa da hegemonia atacadista de drogas e armas na fronteira incidiram diretamente no recrutamento de jovens e no número de encarceramentos no estado. | Para fechar, Giovanni França (UFMS) analisa o envolvimento de jovens com a criminalidade no estado de Mato Grosso do Sul (MS), demonstrando como a expansão do narcotráfico em todas as regiões do estado e os conflitos entre as duas principais facções criminosas do Brasil pela disputa da hegemonia atacadista de drogas e armas na fronteira incidiram diretamente no recrutamento de jovens e no número de encarceramentos no estado. | ||
== | == Ver também == | ||
1) O efeito gangue sobre a dinâmica dos homicídios: um estudo sobre o caso de Cambé/PR - [[O efeito gangue sobre a dinâmica dos homicídios: um estudo sobre o caso de Cambé/PR (artigo)|clique aqui para acessar!]] | 1) O efeito gangue sobre a dinâmica dos homicídios: um estudo sobre o caso de Cambé/PR - [[O efeito gangue sobre a dinâmica dos homicídios: um estudo sobre o caso de Cambé/PR (artigo)|clique aqui para acessar!]] | ||
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7) Os jovens e a criminalidade em Mato Grosso do Sul - [https://wikifavelas.com.br/index.php/Os_jovens_e_a_criminalidade_em_Mato_Grosso_do_Sul_(Artigo) clique aqui para acessar!] | 7) Os jovens e a criminalidade em Mato Grosso do Sul - [https://wikifavelas.com.br/index.php/Os_jovens_e_a_criminalidade_em_Mato_Grosso_do_Sul_(Artigo) clique aqui para acessar!] | ||
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