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<p class="normal" style="text-align:justify"><span style="line-height:150%"><span lang="EN" style="font-size:12.0pt"><span style="line-height:150%"><span style="font-family:">Desde a década de 1980 existiam brigas nos bailes entre diferentes galeras, turmas de jovens identificadas a diferentes bairros e locais da região metropolitana do Rio de Janeiro. Nos anos 1990, foram criados os “bailes de briga”, que se tornaram uma variação de baile bastante comum no mundo funk, buscando tornar rentável a atividade guerreira que já estimulava a frequência dos brigões. Nestas festas, grupos de jovens se reuniam nos clubes para dançar, namorar e brigar com rivais. Os grupos eram formados de acordo com o local de moradia e, no princípio, não havia relação mais estreita entre eles e as facções que naquele período disputavam territórios nas favelas cariocas. As brigas eram institucionalizadas e a emoção derivada delas fazia parte da diversão. Como em um LP, o baile se dividia entre lado A e Lado B, fronteira marcada por um corredor guardado por seguranças que, no auge da euforia instigada pela música, relaxavam o controle para que os dois lados pudessem se confrontar.</span></span></span></span></p> <p class="normal" style="text-align:justify"><span style="line-height:150%"><span lang="EN" style="font-size:12.0pt"><span style="line-height:150%"><span style="font-family:">Os bailes de corredor foram usados pela mídia corporativa e por agentes estatais como um exemplo do potencial violento e perigoso dos jovens favelados, justificando, assim, perseguição aos bailes. Como sublinham diversos autores, já no início da década de 1990 veículos de comunicação passaram a associar o funk e a juventude favelada ao tráfico de drogas ilícitas e à violência urbana, entendida como sinônimo de violência armada (Lopes: 2010; Herschman: 1997; Facina: 2010; Mattos: 2006). Essa juventude é representada como “classe perigosa” que tinha no funk seu “grito de guerra incivilizado” contra os “civilizados valores dominantes” (Facina: 2010). Esse estigma que associava a juventude negra e favelada e o funk à criminalidade foi reiterado ao longo da década de 1990 por políticas estatais e pela grande mídia, produzindo não apenas um inimigo como sua respectiva trilha sonora.</span></span></span></span></p> <p class="normal" style="text-align:justify"><span style="line-height:150%"><span lang="EN" style="font-size:12.0pt"><span style="line-height:150%"><span style="font-family:">Como resposta a estas tentativas de criminalização funkeiros, donos de clubes e de equipes criaram os “festivais de galera”, que buscavam canalizar as disputas através de gincanas, danças e músicas. Ganham espaço neste período os raps “pede a paz”, que exaltavam as comunidades e pediam o fim da violência (Mattos: 2006, p. 34). Canções hoje clássicas como ''Endereço dos Bailes, ''dos MCs Júnior e Leonardo, ''Rap da Cidade de Deus'', de Cidinho e Doca e ''Rap do Salgueiro, ''de Claudinho e Buchecha, entre outras, são exemplos de músicas marcantes deste período.</span></span></span></span></p> <p class="normal" style="text-align:justify"><span style="line-height:150%"><span lang="EN" style="font-size:12.0pt"><span style="line-height:150%"><span style="font-family:">Os clamores por paz não impediram que os bailes fossem paulatinamente fechados e, ao fim da década de 1990, a maioria dos bailes em clubes havia sido extinta. Com os bailes tendo espaço cada vez mais restrito no asfalto, as favelas passaram a ser o principal ambiente de fruição do funk. Estes bailes já existiam desde a década de 1980, mas não tinham a proporção que alcançariam mais tarde. O final da década de 1990 também marcou a proliferação de bases que mixavam o volt-mix com ritmos afro-brasileiros. Mas nenhuma destas bases seria tão influente quanto o tamborzão.</span></span></span></span></p> | <p class="normal" style="text-align:justify"><span style="line-height:150%"><span lang="EN" style="font-size:12.0pt"><span style="line-height:150%"><span style="font-family:">Desde a década de 1980 existiam brigas nos bailes entre diferentes galeras, turmas de jovens identificadas a diferentes bairros e locais da região metropolitana do Rio de Janeiro. Nos anos 1990, foram criados os “bailes de briga”, que se tornaram uma variação de baile bastante comum no mundo funk, buscando tornar rentável a atividade guerreira que já estimulava a frequência dos brigões. Nestas festas, grupos de jovens se reuniam nos clubes para dançar, namorar e brigar com rivais. Os grupos eram formados de acordo com o local de moradia e, no princípio, não havia relação mais estreita entre eles e as facções que naquele período disputavam territórios nas favelas cariocas. As brigas eram institucionalizadas e a emoção derivada delas fazia parte da diversão. Como em um LP, o baile se dividia entre lado A e Lado B, fronteira marcada por um corredor guardado por seguranças que, no auge da euforia instigada pela música, relaxavam o controle para que os dois lados pudessem se confrontar.</span></span></span></span></p> <p class="normal" style="text-align:justify"><span style="line-height:150%"><span lang="EN" style="font-size:12.0pt"><span style="line-height:150%"><span style="font-family:">Os bailes de corredor foram usados pela mídia corporativa e por agentes estatais como um exemplo do potencial violento e perigoso dos jovens favelados, justificando, assim, perseguição aos bailes. Como sublinham diversos autores, já no início da década de 1990 veículos de comunicação passaram a associar o funk e a juventude favelada ao tráfico de drogas ilícitas e à violência urbana, entendida como sinônimo de violência armada (Lopes: 2010; Herschman: 1997; Facina: 2010; Mattos: 2006). Essa juventude é representada como “classe perigosa” que tinha no funk seu “grito de guerra incivilizado” contra os “civilizados valores dominantes” (Facina: 2010). Esse estigma que associava a juventude negra e favelada e o funk à criminalidade foi reiterado ao longo da década de 1990 por políticas estatais e pela grande mídia, produzindo não apenas um inimigo como sua respectiva trilha sonora.</span></span></span></span></p> <p class="normal" style="text-align:justify"><span style="line-height:150%"><span lang="EN" style="font-size:12.0pt"><span style="line-height:150%"><span style="font-family:">Como resposta a estas tentativas de criminalização funkeiros, donos de clubes e de equipes criaram os “festivais de galera”, que buscavam canalizar as disputas através de gincanas, danças e músicas. Ganham espaço neste período os raps “pede a paz”, que exaltavam as comunidades e pediam o fim da violência (Mattos: 2006, p. 34). Canções hoje clássicas como ''Endereço dos Bailes, ''dos MCs Júnior e Leonardo, ''Rap da Cidade de Deus'', de Cidinho e Doca e ''Rap do Salgueiro, ''de Claudinho e Buchecha, entre outras, são exemplos de músicas marcantes deste período.</span></span></span></span></p> <p class="normal" style="text-align:justify"><span style="line-height:150%"><span lang="EN" style="font-size:12.0pt"><span style="line-height:150%"><span style="font-family:">Os clamores por paz não impediram que os bailes fossem paulatinamente fechados e, ao fim da década de 1990, a maioria dos bailes em clubes havia sido extinta. Com os bailes tendo espaço cada vez mais restrito no asfalto, as favelas passaram a ser o principal ambiente de fruição do funk. Estes bailes já existiam desde a década de 1980, mas não tinham a proporção que alcançariam mais tarde. O final da década de 1990 também marcou a proliferação de bases que mixavam o volt-mix com ritmos afro-brasileiros. Mas nenhuma destas bases seria tão influente quanto o tamborzão.</span></span></span></span></p> | ||
== 2000: O Baile de Favela e o Tamborzão == | == 2000: O Baile de Favela e o Tamborzão == | ||
Nos anos 2000 as favelas cariocas ocuparam um lugar de centralidade no funk. Uma favela foi especialmente importante neste período. Localizada na Zona Oeste do Rio de Janeiro, a Cidade de Deus lançou diversos artistas que marcaram uma segunda onda de sucesso nacional do funk. Deize Tigrona, Tati Quebra-Barraco, Bonde do Tigrão e Bonde do Vinho foram alguns dos artistas e grupos oriundos da CDD que gravaram sucessos eternizados para sempre no imaginário nacional. Estes MCs ajudaram a consolidar um novo subgênero no funk carioca que abordava a sexualidade de forma mais explícita e ficou conhecido como ''putaria''. Algo raro até então, este estilo tinha como característica uma grande presença de artistas mulheres. O rótulo ''putaria'', contudo, não foi adotado pelos artistas no início, especialmente pelas MCs, que se referiam à sua arte como “funk sensual” ou de “duplo sentido”. A obra destas mulheres levantou boas reflexões sobre a relação entre o funk e os feminismos (Adriana Lopes: 2010; Raquel Moreira: 2012; Mariana Gomes: 2015). | |||
Outro grande legado dessa geração da Cidade de Deus foi o ''tamborzão''. Embora não tenha sido o criador desta base rítmica, o DJ Duda da CDD foi o responsável por usar o tamborzão nas músicas de todos os artistas citados anteriormente, o que tornou essa base tão popular que sua sonoridade confunde-se com a própria identidade do que é o funk. Base marcante que sintetiza muito bem a união entre os gêneros eletrônicos norte-americanos e traços da música afro-brasileira, o tamborzão rapidamente foi adotado por DJs de diferentes favelas e contribuiu para o grande sucesso nacional do funk nos anos 2000. Apesar deste protagonismo, o baile da Cidade de Deus era apenas mais um em meio a centenas que ocorriam em favelas cariocas. Alguns dos mais famosos eram o baile do Buraco Quente (na Mangueira), Borel, Turano, Fazendinha (no Complexo do Alemão), Chatuba (no Complexo da Penha), Árvore Seca (no Lins), Cantagalo, Curva do S na Rocinha, Favo de Acari entre outros. | |||
A primeira década dos anos 2000 também foi marcada pelo sucesso de outro subgênero, o ''proibidão'', na época também conhecido como ''neurótico''. Estas categorias fazem referência às músicas que narram o universo da criminalidade, tematizando o cotidiano e as sociabilidades ligadas à categoria “bandido” e ao mundo do crime. Este estilo de funk já existia desde os anos 1990. A primeira gravação do ''Rap do Parapapá, ''interpretado pelos MCs Cidinho e Doca, por exemplo, é de 1994. Com a consolidação dos bailes de favela essas músicas conquistaram grande projeção ao narrar as mazelas de um cotidiano violento, acossado pela miséria e a fome, forjado na precariedade de direitos. Contrapondo-se ao discurso oficial e midiático, que trata os “bandidos” como seres abjetos, os proibidões narram essas figuras como sujeitos complexos com posicionamentos críticos acerca do que a sociedade é e o que ela poderia ser. Discurso “da favela sobre a favela para a favela” (Caceres, Ferrari e Palombini 2014: 178), estas narrativas expõem as contradições de políticas de Estado que tratam os corpos favelados como vidas que valem menos. | |||
Os bailes de favela fazem girar uma economia milionária que sustenta centenas de famílias que obtêm deles sua fonte de renda. Sustentado majoritariamente pelas contribuições dos barraqueiros que vendem bebidas e alimentos, os bailes geram renda para donos de equipe, carregadores de caixas de som, técnicos de som, além de DJs e MCs. É esta economia colaborativa e comunitária que financiou um dos movimentos culturais mais potentes do país. O momento áureo destes bailes foi interrompido pelo advento das Unidades de Polícia Pacificadora. A primeira UPP foi implantada em 2008 na favela Santa Marta e a ela se seguiram outras 37, em diferentes favelas da cidade do Rio de Janeiro e da Baixada Fluminense. Como ressalta Marcia Leite, este número esteve longe de abranger as mais de mil favelas do Rio de Janeiro (Leite: 2012), mas atingiu algumas das principais produtoras e divulgadoras do funk carioca, extinguindo alguns dos principais bailes. Junto com a criação da Kondzilla, produtora de vídeos paulista que hoje é o maior canal dedicado a música no YouTube, as UPPs foram um fator preponderante para que o posto de centro irradiador do funk no cenário nacional migrasse para São Paulo. | |||
== O 150 Bpm e a Nova Geração do Funk Carioca == | == O 150 Bpm e a Nova Geração do Funk Carioca == | ||