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==Movimentos Sociais em Saúde== | ==Movimentos Sociais em Saúde== | ||
O papel dos movimentos sociais em saúde é histórico. A própria história da construção da Saúde como direito universal de cidadania se deu lá atrás, na oitava Conferência Nacional de Saúde, com uma ampla participação da sociedade brasileira. Foi uma conferência que teve mais de 5 mil delegados e isso plasmou na construção dessa política pública exemplar, que é a construção da Saúde como direito universal no Brasil. Ela plasmou essa diretriz fundante que é a da participação social. Então, os movimentos sociais são como eu até assisti em várias conferências livres e até estaduais, as pessoas dizerem: “eu sou construtor do SUS”. É esse o sentimento que os movimentos sociais Brasil afora têm: “Nós construímos esse sistema”. Esse é o papel: construtores de uma política pública exemplar de direitos universais e que, por ser exemplar, por ter essa participação extraordinária da população na construção, o que é realmente algo inédito até mundo afora, o SUS consegue resistir. Resiste graças a essa presença cotidiana dos movimentos sociais na sua construção. | O papel dos movimentos sociais em saúde é histórico. A própria história da construção da Saúde como direito universal de cidadania se deu lá atrás, na oitava Conferência Nacional de Saúde, com uma ampla participação da sociedade brasileira. Foi uma conferência que teve mais de 5 mil delegados e isso plasmou na construção dessa política pública exemplar, que é a construção da Saúde como direito universal no Brasil. Ela plasmou essa diretriz fundante que é a da participação social. Então, os movimentos sociais são como eu até assisti em várias conferências livres e até estaduais, as pessoas dizerem: “eu sou construtor do SUS”. É esse o sentimento que os movimentos sociais Brasil afora têm: “Nós construímos esse sistema”. Esse é o papel: construtores de uma política pública exemplar de direitos universais e que, por ser exemplar, por ter essa participação extraordinária da população na construção, o que é realmente algo inédito até mundo afora, o SUS consegue resistir. Resiste graças a essa presença cotidiana dos movimentos sociais na sua construção. | ||
==Resistência durante a Pandemia de Covid-19== | |||
O papel dos movimentos sociais foi, eu diria, definitivo. Por que definitivo? Primeiro, porque o Conselho Nacional de Saúde, ao contrário de todo o projeto do governo anterior que destruiu todos os instrumentos de participação social. Todos os conselhos de participação social foram simplesmente aniquilados no governo anterior. Só resistiram dois: o Conselho Nacional de Saúde e o Conselho Nacional de Direitos Humanos, que estavam previstos em lei. Então era impossível destruir esse Conselho. No caso do Conselho Nacional de Saúde, que eu participava, naquele momento do governo anterior, na condição de presidenta do Centro Brasileiro de Estudos da Saúde (CEBES), e vi todo o processo de resistência monumental que o Conselho Nacional de Saúde exerceu no contexto da pandemia, a maior catástrofe sanitária da história do país. Um genocídio, na verdade, é o que aconteceu: 10% das mortes de Covid do mundo e 3% da população do mundo. E na verdade, as 700 mil mortes provavelmente estão subnotificadas, porque nós tivemos também, no governo anterior, um apagão de informações. Então foi uma coisa muito grave, um verdadeiro desastre. E esse desastre, que tem várias camadas que afetaram profundamente a população brasileira, essa memória precisa ser resgatada. Os movimentos sociais foram fundamentais, não só através do Conselho Nacional de Saúde, que foi uma coisa importantíssima, mas também com a criação naquele momento da Frente pela Vida, que entidades históricas da luta da Reforma Sanitária brasileira, como é o caso do Cebes, da Abrasco, da Rede Unida, da Sociedade Brasileira de Bioética e a própria presença de conselheiros nacionais de Saúde na Frente pela Vida. Nós dissemos o seguinte naquele momento: os movimentos sociais em saúde vão ter que se colocar. Nós não podemos faltar à população brasileira nesse momento de grave crise sanitária. E foi o que fizemos. Organizamos a Frente pela Vida, apresentamos um plano nacional de enfrentamento à COVID, fizemos marcha virtual a Brasília, um conjunto de iniciativas que acabou culminando no dia 5 de agosto de 2022 com uma primeira Conferência Livre Democrática Nacional Popular de Saúde. Essa conferência, ela teve a presença maravilhosa do presidente Lula, onde nós entregamos o nosso manifesto com as diretrizes da Frente pela Vida e naquele momento, colocamos que a saúde tem que ser 100% pública. Colocamos as diretrizes da carreira de Estado para os profissionais da área da Saúde. Colocamos a diretriz da construção de uma rede integral de atenção à Saúde da população que possa ter qualidade e dignidade. E colocamos também naquele momento a questão do financiamento, que era importante retomar o financiamento para consolidar o SUS como política universal de cidadania. E também, compreendendo naquele momento, e colocamos isso naquele documento, que a Saúde precisava ser encarada como um eixo estratégico de desenvolvimento, porque a pandemia, com o seu complexo econômico industrial, para que o país tivesse soberania e segurança sanitária, porque a pandemia trouxe um alerta. Nós estamos vivendo um mundo com uma crise climática extrema, as emergências sanitárias serão cada vez mais frequentes, infelizmente. Mas esse é um dado da realidade e nós não podemos ser surpreendidos nessas emergências sanitárias mais uma vez. Então, é bom lembrar que, naquele momento, instituições públicas centenárias, como é o caso da Fundação Oswaldo Cruz e do Instituto Butantan, foram vitais para prover a vacina para a população brasileira e também nós pudemos articular, tanto o Conselho, Frente pela Vida e todos esses movimentos sociais, um movimento fortíssimo que foi “vacina no braço e a comida no prato”. Então os movimentos sociais defenderam a vida, defenderam a Saúde e defenderam a democracia naquele momento catastrófico que nós atravessamos. Eu acho que nós temos um desafio enorme nesse momento. Eu acho que lá atrás, quando nós construímos a Saúde como direito nesse processo, esse movimento da Reforma Sanitária, nós também concebemos um campo de conhecimento chamado a Saúde Coletiva, originalmente brasileiro, com pessoas fundamentais como Arouca, Cecília Donnângelo e tantos outros, que colocaram a ideia inovadora no Brasil de que a saúde era fruto da determinação social desse processo Saúde-doença, portanto, ligada à questão de várias dimensões da vida, como moradia, educação, lazer, cultura, ambiente, emprego, trabalho digno. Então, todas essas dimensões da vida interferem numa sociedade e nos territórios, na produção da Saúde. Então, qual é o grande desafio deste momento de reconstrução e transformação do Brasil, que é também uma agenda do governo do presidente Lula? É você trabalhar cada vez mais com isso, que lá atrás propúnhamos à Saúde: a intersetorialidade. Nós precisamos avançar no que eu estou chamando de uma nova geração de políticas públicas que possa, a nível de cada território, trabalhar esse desenvolvimento territorial, colocando as metas de cada território, articulando todas as políticas públicas e os agentes públicos em cada território, para que a gente possa, até usando o lema da Conferência Nacional de Saúde, a 17ª, “o Brasil que temos e o queremos”, trazer isso pra cada lugar, para cada território, para cada região. Que região, que território, que comunidade é essa? O que nós temos e o que nós queremos? Quer dizer, quais são as metas daquela região, daquela localidade para o Brasil? Esse grupo que se apodera e concentra renda no Brasil, ele na verdade encalhou o Brasil. Nós precisamos desencalhar o nosso país e essa força social, porque algo que também vimos nesse processo todo, como a sociedade brasileira amadureceu. Hoje nós temos uma sociedade organizada, com uma pluralidade, uma diversidade extraordinária de organização: movimentos negros, LGBT, movimento quilombola, movimento dos povos indígenas, das mulheres. É uma diversidade tão impressionante que mostra que ninguém ficou parado. As pessoas já fizeram a sua luta para fazer mais do que sobreviver, criar espaços de novas vivências, de novas construções, mostrando os caminhos que a gente deve perseguir e que redes a gente deve fortalecer para que a gente mude essa correlação de forças para contribuir para a gente afirmar esse país da solidariedade, dos direitos, dos cuidados. Quer dizer, um país que possa ter a solidariedade, o cuidado como base e não essa universalização de mal estar, que foi a tônica desse processo catastrófico que a gente atravessou, felizmente. | |||
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