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Notadamente, mesmo que escritas em outra época (reunindo marcas e interesses de cada tempo), as obras do casal Leeds e de Machado da Silva produzem efeitos significativos aos estudos urbanos, principalmente por demonstrarem como as favelas estão conectadas a outras escalas, além de demonstrarem como as formas de produção da política, do poder e da violência, nesses territórios, são heterogêneas e situadas em conjunturas históricas. | Notadamente, mesmo que escritas em outra época (reunindo marcas e interesses de cada tempo), as obras do casal Leeds e de Machado da Silva produzem efeitos significativos aos estudos urbanos, principalmente por demonstrarem como as favelas estão conectadas a outras escalas, além de demonstrarem como as formas de produção da política, do poder e da violência, nesses territórios, são heterogêneas e situadas em conjunturas históricas. | ||
== Crítica à Sociabilidade Violenta == | |||
Autor: Matheus de Moura | |||
Movido pelas angústias com as mudanças drásticas nas dinâmicas da violência urbana; angústias estas acumuladas ao longo de décadas realizando e orientando trabalhos de campo em favelas, quase sempre com foco nas relações de trabalho e no associativismo, Machado cria uma teoria que é, ao mesmo tempo, um esforço original de explicar o que torna o Rio de Janeiro um lugar com tanta circulação de conflitos bélicos envolvendo armamento pesado e trocas intensas de tiro. O problema deste esforço contudo está no fato de que, do ponto de vista teórico, ele termina por construir uma perspectiva teórica que mais parece um desabafo desiludido de um homem incapaz de entender as dinâmicas do mundo urbano do que um instrumento analítico versátil. | |||
Desde a escrita e publicação de seus primeiros rascunhos da "Sociabilidade Violenta", Machado se viu alvo de críticas. A sua maioria no campo do debate verbal, das intrigas em palestras e fofocas dos circuitos acadêmicos — é considerado de bom tom, no mundo das ciências sociais, que se evite conflito direto nas publicações, assim, faz-se um campo de debate pautado massivamente na crítica indireta ou no boicote, recusando-se a citar e reconhecer a existência da teoria, matando-a então pelo inanição. Apesar das estranhas relações entre crítica pública e crítica privada, um fato é certo: Sociabilidade Violenta provocou o campo dos estudos de violência urbana, forçando autores a ou aprimorarem a ideia ou propor alternativas interpretativas. | |||
O problema do conceito de Machado então pode ser resumido à incorporação da incapacidade assimilativa do autor à epistemologia dessa teoria. O sociólogo não entende o que gera uma sociedade tão violenta; embasbacado com o que enxerga como uma degeneração do laço social, parte então de seu próprio limite intelectual para impor uma interpretação problemática. Para Machado, a violência urbana, em especial nas favelas, se torna tão intensa e cruel que ela, eventualmente, evolui e, na visão dele evoluiu, para um linguagem própria, um jeito de resolver questões, viver a vida e se relacionar com os outros. Um jeito sórdido que carece de qualquer moralidade e fundamento ético-filosófico. De certa forma, é com se a racionalidade mínima fosse substituída pela eterna lei da imposição da força. | |||
Esse caminho é pernicioso, pois acaba por bestializar os criminosos, pondo-os à parte da própria condição de sujeito, pois, segundo a lógica apresentada por Machado, esses indivíduos constituíram uma linguagem quase ininteligível de violência pura. Todavia, um dos muitos problemas de se desumanizar assim essas pessoas é que acaba por reproduzir perspectivas racistas. A maioria dos homens sobre os quais se refere Machado são jovens negros e favelados, pessoas produzidas por um longo e acumulativo processo de violência racial urbana. Bestializar um homem negro por estar numa posição de violência extrema é racismo. Não se espera de Machado que tenha empatia com os atos nefastos, com o terror produzido, mas sim que consiga alcançar algum grau de nuance e, partir dela, possa desenvolver uma interpretação mais rica sobre qual a racionalidade de sujeitos,—pois é isto que são: sujeitos, e com certo grau de soberania — e como elas se desenvolvem e partir do quê. A negação da racionalidade é a aceitação da própria derrota enquanto intelectual, um abraço às facilidade do racismo tácito e, quem sabe, subconsciente. | |||
Difícil saber o que poderia ter melhorado essa teoria. Talvez se Machado fosse mais letrado em leituras raciais? Talvez se tivesse escrito a partir de seus trabalhos de campo e não a partir dos de outras pessoas. Não se tem como ter certeza. Tudo que se pode fazer é reconhecer que a teoria é falha, passível de críticas e de suspeita quanto a qual tipo de representação social ela evoca. | |||
== Referências bibliográficas == | == Referências bibliográficas == |
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