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Quando nos recordamos dos anos seguintes, lembramos do assassinato da própria vereadora Marielle Franco, em 2018. Sua vida, que representava milhares de outras mulheres negras, faveladas e lésbicas brasileiras, foi interrompida. Não foi coincidência que no mesmo período, o país viveu uma grande onda conservadora orquestrada pelo próprio Presidente da República da época. | Quando nos recordamos dos anos seguintes, lembramos do assassinato da própria vereadora Marielle Franco, em 2018. Sua vida, que representava milhares de outras mulheres negras, faveladas e lésbicas brasileiras, foi interrompida. Não foi coincidência que no mesmo período, o país viveu uma grande onda conservadora orquestrada pelo próprio Presidente da República da época. | ||
Tal onda conservadora também tomou conta das favelas e periferias, foram inúmeras adolescentes e jovens lésbicas que passaram a sofrer ainda mais preconceitos por sua orientação sexual dentro destes territórios. Com a chegada da pandemia da Covid-19, em 2020, a convivência familiar para estes grupos piorou, muitas entraram em depressão, outras saíram de seus lares procurando apoio entre os grupos de acolhimento formados na emergência naquele ano. | Tal onda conservadora também tomou conta das favelas e periferias, foram inúmeras adolescentes e jovens lésbicas que passaram a sofrer ainda mais preconceitos por sua orientação sexual dentro destes territórios. Com a chegada da [[Coronavírus nas favelas|pandemia da Covid-19]], em 2020, a convivência familiar para estes grupos piorou, muitas entraram em depressão, outras saíram de seus lares procurando apoio entre os grupos de acolhimento formados na emergência naquele ano. | ||
Por isso, hoje, em pleno 2023, momento em que o país tenta se reerguer destes anos tão difíceis e traumatizantes, temos como papel político visibilizar e tornar memória ações como a do Ocupa Sapatão, atividade realizada desde 2017 pelas ruas do Centro do Rio de Janeiro. O Ocupa é organizado por movimentos sociais de lésbicas e ativistas autônomas que constroem de maneira horizontalizada o 29 de agosto e atividades do mês da visibilidade lésbica. | Por isso, hoje, em pleno 2023, momento em que o país tenta se reerguer destes anos tão difíceis e traumatizantes, temos como papel político visibilizar e tornar memória ações como a do Ocupa Sapatão, atividade realizada desde 2017 pelas ruas do Centro do Rio de Janeiro. O Ocupa é organizado por movimentos sociais de lésbicas e ativistas autônomas que constroem de maneira horizontalizada o 29 de agosto e atividades do mês da visibilidade lésbica. | ||
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Neste dia, cerca de 40 mulheres lésbicas – com o apoio de pessoas trans da CasaNEM – ocuparam a galeria da Câmara Municipal para pressionar os vereadores que reverberaram lesbofobia e machismo. Camila contou nesta entrevista que toda essa raiva foi utilizada como instrumento pedagógico de luta: "Lembro que houve uma reunião na minha casa, estávamos sentadas no chão e pensamos juntas o nome Ocupa Sapatão, como um movimento político de denúncia e resistência, com falas e apresentações artísticas em frente à Câmara Municipal, na Cinelândia". | Neste dia, cerca de 40 mulheres lésbicas – com o apoio de pessoas trans da CasaNEM – ocuparam a galeria da Câmara Municipal para pressionar os vereadores que reverberaram lesbofobia e machismo. Camila contou nesta entrevista que toda essa raiva foi utilizada como instrumento pedagógico de luta: "Lembro que houve uma reunião na minha casa, estávamos sentadas no chão e pensamos juntas o nome Ocupa Sapatão, como um movimento político de denúncia e resistência, com falas e apresentações artísticas em frente à Câmara Municipal, na Cinelândia". | ||
No dia de realização do Ocupa, naquele 29 de agosto, quando todas elas pensaram que seria uma noite delas, o inesperado aconteceu… Uma manifestação invadiu o ato e um dos homens tentou pegar o microfone sob o argumento de “que todas ali elas eram companheiros”. Camila lembrou que naquela ocasião, duas mulheres com uma força gigante evocaram respeito e diziam: <blockquote>"Porque, sim, somos companheiros e companheiras na luta e estamos todos os dias nas ruas com todo mundo, mas no nosso dia queriam, mais uma vez, apagar o nosso ato. E aí sempre perguntamos: quando todas as pessoas companheiras vão apoiar as sapatonas?", argumentou.</blockquote>Ao perguntar sobre as principais pautas levantadas durante a construção de todos os Ocupas realizados durantes estes anos, Camila afirmou que, <blockquote>"a visibilidade lésbica é uma pauta central, e isso não significa close, pois queremos estar nas políticas públicas. Hoje, convivemos com um apagamento de dados e das políticas públicas específicas para lésbicas. Por exemplo, se vamos fazer um preventivo e falamos que somos lésbicas, a narrativa dos médicos é a de que não precisamos fazer o exame, o que é uma lesbofobia enorme". </blockquote>Também é pautado sobre a visibilidade lésbica nas escolas, pois | No dia de realização do Ocupa, naquele 29 de agosto, quando todas elas pensaram que seria uma noite delas, o inesperado aconteceu… Uma manifestação invadiu o ato e um dos homens tentou pegar o microfone sob o argumento de “que todas ali elas eram companheiros”. Camila lembrou que naquela ocasião, duas mulheres com uma força gigante evocaram respeito e diziam: <blockquote>"Porque, sim, somos companheiros e companheiras na luta e estamos todos os dias nas ruas com todo mundo, mas no nosso dia queriam, mais uma vez, apagar o nosso ato. E aí sempre perguntamos: quando todas as pessoas companheiras vão apoiar as sapatonas?", argumentou.</blockquote>Ao perguntar sobre as principais pautas levantadas durante a construção de todos os Ocupas realizados durantes estes anos, Camila afirmou que, <blockquote>"a visibilidade lésbica é uma pauta central, e isso não significa close, pois queremos estar nas políticas públicas. Hoje, convivemos com um apagamento de dados e das políticas públicas específicas para lésbicas. Por exemplo, se vamos fazer um preventivo e falamos que somos lésbicas, a narrativa dos médicos é a de que não precisamos fazer o exame, o que é uma lesbofobia enorme". </blockquote>Também é pautado sobre a visibilidade lésbica nas escolas, pois segundo Camila, é preciso cada vez mais falar sobre os direitos das lésbicas nos espaços escolares como uma forma de combater o bullying lesbofóbico. Afinal, quem nunca viu uma frase de ódio escrita em carteira ou em porta de banheiro? Ou quando meninas e jovens sofrem estupro corretivo dentro de suas casas apenas por serem lésbicas? <blockquote>"Nós combatemos e denunciamos essas violências. Além disso, em nossas manifestações sempre reivindicamos justiça por Marielle. Em alguns anos, tivemos como mote a luta contra a militarização da vida; em defesa do direito à água contra a privatização da Cedae e outros impactos que atingem diretamente as nossas vidas".</blockquote> | ||
== Ocupa Sapatão 2023, participação das favelas e a escolha dos temas prioritários == | == Ocupa Sapatão 2023, participação das favelas e a escolha dos temas prioritários == | ||
Dayana Gusmão também participa do Ocupa. Dayana é uma das integrantes da Resistência Lésbica da Maré, localizado na Maré, favela localizada na Zona Norte do Rio de Janeiro. Ela ressaltou que, embora a visibilidade lésbica aconteça uma vez ao ano, o trabalho de base é feito o ano inteiro. Contou ainda que a entrada de lésbicas faveladas no movimento social de lésbicas tem trajetória muito similar à entrada de mulheres negras no feminismo branco hegemônico. "Essa entrada é feita à base de ocupação". | Dayana Gusmão também participa do Ocupa. Dayana é uma das integrantes da Resistência Lésbica da Maré, localizado na [[Complexo da Maré|Maré]], favela localizada na Zona Norte do Rio de Janeiro. Ela ressaltou que, embora a visibilidade lésbica aconteça uma vez ao ano, o trabalho de base é feito o ano inteiro. Contou ainda que a entrada de lésbicas faveladas no movimento social de lésbicas tem trajetória muito similar à entrada de mulheres negras no feminismo branco hegemônico. "Essa entrada é feita à base de ocupação". | ||
De acordo com Dayana, a Resistência Lésbica da Maré compõe a Ocupa Sapatão desde 2017 fazendo um duplo movimento: Primeiro, colocar dentro da Ocupa a lembrança que este movimento é feito com as favelas. Segundo, promover entre lésbicas de favela, o entendimento de que a Favela faz parte da cidade e, portanto, todos espaços devem ser ocupados para garantir que nossas lutas compunham este movimento e, assim, possamos usá-lo como ferramenta para luta por direitos ...não é fácil fazer corpos socializados com a vertente da exclusão social e política, desenvolverem acreditação em espaços não favelados. | De acordo com Dayana, a Resistência Lésbica da Maré compõe a Ocupa Sapatão desde 2017 fazendo um duplo movimento: Primeiro, colocar dentro da Ocupa a lembrança que este movimento é feito com as favelas. Segundo, promover entre lésbicas de favela, o entendimento de que a Favela faz parte da cidade e, portanto, todos espaços devem ser ocupados para garantir que nossas lutas compunham este movimento e, assim, possamos usá-lo como ferramenta para luta por direitos ...não é fácil fazer corpos socializados com a vertente da exclusão social e política, desenvolverem acreditação em espaços não favelados. |